15 de janeiro de 2014

Resposta à reportagem "Um macumbódromo para o Rio", enviada à revista IstoÉ




No último sábado, nós da Seam/SEA fomos surpreendidos pelo título preconceituoso de uma matéria da revista IstoÉ sobre o Espaço Sagrado que estamos construindo junto com a UERJ, a UFRJ e os povos e comunidades de terreiro. 

Já não é de hoje que a grande mídia hegemônica reproduz e incentiva o racismo, a desigualdade e a exclusão, mas não podemos ficar calados e deixar que se construa humor e sensacionalismo em cima da difamação e degradação de um grupo social. Em resposta, enviamos à revista o texto abaixo. 

Prezados editores,

A Superintendência de Educação Ambiental da Secretaria de Estado do Ambiente do Rio de Janeiro manifesta seus profundos descontentamento e surpresa com o uso da palavra "macumbódromo" no título da reportagem "Um macumbódromo para o Rio", publicada na edição de 10 de janeiro de 2014 da IstoÉ.

O termo "macumba", embora ainda seja largamente utilizado para tratar das diversas crenças e práticas religiosas trazidas da África ao Brasil pelos escravos negros -- como a Umbanda e o Candomblé --, carrega forte tom pejorativo e racista. É mais uma herança infeliz de nosso passado escravocrata que sobrevive até os dias de hoje, junto às outras diversas facetas do racismo com que a população afrodescendente é obrigada a conviver, como a perseguição, a exclusão e o subemprego. Por esse motivo, os próprios movimentos contra o racismo e a intolerância religiosa já há anos descartaram o termo e não se identificam com ele, escolhendo ser tratados por "umbandistas" e "candomblecistas" -- e não "macumbeiros" -- e tratar os elementos que oferecem aos Orixás como "oferendas" -- e não "macumbas".

O texto e o tom da reportagem de Mariana Brugger se mostram muito positivos, apresentando o projeto não apenas como uma solução técnica, mas como uma questão política -- o que, para nós que trabalhamos junto a grupos e movimentos sociais, é de extrema valia. O reconhecimento do Espaço Sagrado a partir de uma perspectiva de luta por direitos e do interesse dos religiosos de matriz afro-brasileira na preservação do ambiente, conforme retratados pela repórter, são os valores e objetivos com que trabalha o programa Ambiente em Ação, no qual se insere a implementação do Espaço Sagrado da Curva do S, abordado pela revista. Infelizmente, porém, esse mesmo cuidado não foi verificado na escolha do título.

Acreditamos que o ocorrido seja uma oportunidade educativa, e que seria extremamente benéfica a divulgação dessa informação aos leitores da IstoÉ, que desde sua fundação em 1976 se compromete com a democracia, os direitos humanos, a pluralidade e o espírito crítico. Solicitamos, portanto, a publicação desta nota em sua integralidade.

Atenciosamente,

Lara Moutinho da Costa
Superintendente de Educação Ambiental
Secretaria de Estado do Ambiente do Rio de Janeiro.